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EDITORIAL | “Pai D'Égua” pode estar tirando do radar contribuintes especialistas em sonegação fiscal

As ideias defendidas nos artigos publicados neste Blog são de responsabilidade dos autores e não necessariamente refletem a posição institucional da Auditece.

 

Publicado em: 25/05/2022

EDITORIAL | “Pai D'Égua” pode estar tirando do radar contribuintes especialistas em sonegação fiscal

A notícia de que o Ministério Público do Estado do Ceará (MP-CE) e a Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará (Sefaz-CE) deflagraram, nesta terça-feira (24), uma operação com o objetivo de desarticular um esquema de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro no segmento de bebidas ocupou as editorias de economia dos principais veículos de comunicação do estado.

Denominada “Escócia”, a operação cumpriu 32 mandados de busca e apreensão e oito mandados de prisão, sendo seis temporários e dois preventivos, em Fortaleza e mais sete cidades cearenses, para desmantelar a organização que teria sonegado cerca de R$ 30 milhões, em quatro anos. Todas essas informações são de conhecimento público, foram divulgadas, inclusive, em coletiva de imprensa convocada pelos órgãos envolvidos na operação.

Mas uma informação, que também é pública e parece ter passado despercebida, é a de que uma das empresas que compõem a organização criminosa está ranqueada como Contribuinte Pai D’Égua.

O programa concede aos contribuintes que atendem aos parâmetros estabelecidos pelo sistema diversas vantagens, como a renovação automática e simplificada do Regime Especial de Tributação, a concessão de credenciamento especial, o tratamento favorecido nos procedimentos de controle de mercadorias em trânsito e a possibilidade de autorregularização de suas obrigações tributárias.

A regulamentação – Decreto nº 33.820/2020, Art.8º, X, alíneas “a” e b” – institui a priorização do monitoramento antes da instauração de qualquer tipo de procedimento fiscalizatório e oportuniza a regularização de inconsistências e irregularidades, em caso de detecção, por meio do monitoramento.

Na prática, isso quer dizer que essas empresas possuem uma espécie de blindagem, já que não podem ser fiscalizadas antes de serem monitoradas. Se o Auditor detectar alguma irregularidade, o contribuinte é notificado para cumprir suas obrigações tributárias “espontaneamente”.  Assim, a legislação do Programa Contribuinte Pai D’Égua impede diretamente a emissão de um Mandado de Ação Fiscal (MAF).

Essa informação nos leva a crer que, provavelmente, a Operação Escócia teve de ser deflagrada sob o escudo do Ministério Público, visto que o sistema da Sefaz-CE impede a emissão de MAF’s aos contribuintes ranqueados no Pai D'Égua.

Estamos diante de uma grave falha sistêmica do Programa Pai D’Égua, que classificou como excelente contribuinte – digno de benesses por sua conformidade tributária exemplar – uma empresa que, na verdade, estava defraudando o Erário, em milhões, há anos.

Apenas o primeiro e maior exemplo que vem a público. Mas a verdade é que contribuintes mal intencionados – a minoria, ressalte-se – já possuem a visão sistêmica necessária para burlar o código do programa. Com este caso, é límpido o entendimento de que a utilização de parâmetros de classificação de contribuintes não pode vedar ou inibir uma Ação Fiscal.

Se a atividade de Auditoria Fiscal for cerceada, se a sociedade cearense não puder contar com esse o trabalho minucioso, cada vez mais uma parte dos contribuintes se sentirá à vontade para – conhecendo os parâmetros de conformidade – aperfeiçoarem seus sistemas para burlar o Estado, enquanto são premiados pela SEFAZ, por serem exemplos de cumprimento às regras. Não é de hoje que a Auditece sinaliza sobre o risco de desmantelamento do trabalho de Auditoria Fiscal.

A Associação dos Auditores Fiscais da Receita Estadual do Ceará tem discordado e alertado reiteradamente sobre a adoção desses parâmetros e atividades, em detrimento da Auditoria, também há anos. E a realização da Operação Escócia é prova nítida de que o sistema que lastreia o Programa Contribuinte Pai D’Égua da Secretaria da Fazenda é falho (e precisa ser aprimorado).

Neste sentido, a Auditece ratifica sua postura de entidade colaborativa, que deseja contribuir para o desenvolvimento e aperfeiçoamento das ferramentas tecnológicas, as quais são aliadas essenciais às atividades de Auditoria Fiscal, mas que não são capazes de substituir o trabalho meticuloso e altamente qualificado dos AFRE’s.

A Auditoria precisa ser ouvida!